Cansada de estar em situação de Substack me dizendo que meus emails estão longos demais, resolvi fazer um experimento.
Vou dividir a newsletter em duas partes: em uma semana, envio os textos que gosto de escrever, em que elaboro mais uma reflexão ou me aprofundo em algum tema, como a carta que escrevi na semana passada, sobre "Dom Casmurro". Na semana seguinte, envio os links e indicações do que tenho descoberto de interessante por aí, como essa que trouxe para você hoje.
Assim, em vez de uma edição quinzenal, teremos um encontro toda semana. Pode ser que você encha o saco de me ver com mais frequência no seu email? Pode ser que essa experiência não funcione bem para mim? Pode ser que eu seja apenas a garotinha da música da Cássia Eller, querendo mudar uma planta de lugar? Bem, vamos descobrir!
Por isso sua opinião é muito importante para nós (eu e as vozes que habitam minha cabeça). Vou adorar se você puder deixar um comentário me dizendo o que acha disso. Ou se preferir falar só comigo, você sempre pode responder aos emails me contando o que quiser.
Fique agora com a seleção de maravilhas que tenho para oferecer essa semana:
Lava
Existem os vulcões vermelhos e os cinza.
Quando os vermelhos entram em erupção, derramam-se em lava quente, em espetáculos incandescentes criados pelo movimento das placas tectônicas se afastando uma da outra.
Os cinzas são como uma explosão nuclear. Cospem uma nuvem de gases, fumaça e cinzas, em explosões poderosas, destrutivas, com o potencial de varrer a vida em um raio de quilômetros de distância. Os cinza entram em erupção quando as placas tectônicas colidem uma com a outra. Toda essa energia gerada pelo impacto é o que torna as explosões tão devastadoras e, ao mesmo tempo, o que expele substâncias que tornam o solo atingido muito mais fértil.
A destruição também é uma força capaz de gerar vida.
Aprendi isso com um casal de cientistas que dedicou a vida a estudar vulcões bem de perto e a registrar tudo em imagens fantásticas, que são uma obra de arte. A história deles é contada no documentário Fire of Love, indicação preciosa que catei na newsletter
e que me emocionou profundamente. Quem diria que a lava poderia ser combustível para uma história de amor?Por falar em vulcões
Fiquei fascinada com o trabalho de Joan Jonas, uma artista que transita entre audiovisual, performance, desenho e criação de instalações. Adoro artistas que caminham entre as fronteiras, que trabalham com diferentes habilidades, sem se limitar por caixinhas. Me identifiquei em particular com a Joan por trazer com frequência o tema ambiental em suas obras, colocando o humano em diálogo com a natureza.
Em uma de suas instalações, ela sobrepõe a leitura de fragmentos do romance Under the Glacier, do islandês Halldor Laxness, com imagens das mãos dela criando uma pintura ao deslizar pedras de gelo sobre manchas de nanquim num papel. No romance, escrito nos anos 60, o autor descreve poeticamente uma geleira que nos dias de hoje está derretendo.
Outro trabalho dela é esse curta de 1989 chamado Volcano Saga, inspirado numa personagem da mitologia islandesa, aqui interpretado por ninguém menos que nossa amiga Tilda Swinton. O filme é uma brisa, e foi originalmente apresentado como uma performance ao vivo, com a personagem contando sonhos esquisitíssimos diante da projeção de imagens que Joan Jonas registrou das paisagens da Islândia.
Muitas de suas obras usam esse recurso de sobrepor performance à projeção de imagens. Achei particularmente interessante a forma que ela utiliza o desenho, como forma de criar movimento, também incorporada às suas performances, como ela mostra neste vídeo:
Filtro de café
Se hoje passamos aquele cafezim gostoso, simples e prático antes de bater um papo ou começar os trabalhos do dia, é graças a uma alemã.
Melitta Bentz foi uma dona de casa em Dresden no final do século 19 que estava de saco cheio de passar café no coador de pano. Além de deixar um gosto ruim, ficava aquela borra no fundo das xícaras. E ela não parecia ser o tipo de gente que acreditava que era possível ler o futuro na borra de café. Ela preferia um futuro com um café sem tantos resíduos.
Engenhosa e criativa, teve a ideia de criar um filtro mais eficiente. O protótipo foi uma folha de caderno de escola do filho. O café saiu muito mais limpo, com um sabor mais agradável. Com o tempo, ela foi aperfeiçoando sua invenção, patenteou o filtro de café e criou uma empresa que se tornou gigante e muito popular. O nome de Melitta foi longe no tempo e no espaço: até hoje pode ser encontrado em muitas cozinhas brasileiras.
Fofoca literária
Para quem gostou do texto da semana passada, fica aqui um material complementar. A Samara compartilhou essa fofoca no grupo dos Valekers e fiquei especulando se Dom Casmurro, mais do que uma confissão de culpa de Bentinho, possa ser uma confissão de talaricagem do próprio autor. Mera especulação, claro. Será?
Uma oração
Que as boas histórias nos vejam e nos escolham. Que as boas histórias nos assombrem e nos guardem, que elas fiquem. Que elas saibam nossos nomes, não nos faltem, não nos excluam, não nos escapem por entre os dedos. Que encontrem pela frente revisores gentis, editores gentilíssimos, prazos gentilérrimos (os revisores gentis deixarão passar). Que as boas histórias nos levem para tomar café num lugar metido a besta. Que elas nos emprestem dinheiro para o papel sulfite, porque é preciso ler cada uma delas no papel, ainda que de quando em vez. Que elas nos deem coragem na hora de bancar a publicação do livro, porque agora somos criaturas independentes e corajosas. Que elas nos chamem pelo nome, ah, melhor ainda, pelo apelido, aquele primeiro, aquele um, o apelido que a madrinha nos deu. Que elas mirem em nosso peito e nos recolham em seus braços macios quando adormecemos no sofá, cansados demais. Cansados demais. Que sejam boas para nós. Mas não muito. Que venham fácil. Mas não muito. Que nós possamos lutar um bocadinho por elas.
A Fal Azevedo escreve e eu só digo amém.
Me despeço no desejo de que tenha sido uma edição proveitosa. E se aprecia o que eu escrevo, considere se tornar um Valeker!
Até nosso próximo encontro.
Um beijo incandescente,
Amei a dica do doc e o formato curto que não é curto. Hahaha
O substack foi meio chato, mas vai ser ótimo te ler toda semana.
Gostei do formato, mas amei a sensação de 🤯 quando juntei Melitta com Melitta! Ahahahha